Ítalo Calvino possui uma vasta obra, onde seu livro mais popular chama-se “As cidades invisíveis”. Muitos tentam dessa obra se apropriar, devida ou indevidamente. Nem sempre aquilo que transparece parece efetivamente ser. Assim acontece na política, principalmente quando se está em período eleitoral ou pré-eleitoral. Aliás, diria mais: nunca estamos medianamente satisfeitos e só percebemos isso quando há uma mudança de rumo. Para ilustrar a introdução, a passagem abaixo é perfeita.
Em uma pequena cidade americana, ao sul dos Estados Unidos, essencialmente agrícola, que um dia já havia sido celeiro da região, por décadas discutiam-se formas de se desenvolver as potencialidades regionais e locais. No entanto, o pensamento médio conservador, essencialmente republicano, acreditava que o retorno à tradição e aos valores daquele povoado fariam com que, um dia, o desenvolvimento ali se instalasse. Continuaram vivendo assim. Anos e anos. Décadas e décadas acreditando que a simples troca de nomes redundaria em desenvolvimento.
Um belo dia um negro ganhou as eleições. Foi o caos. Aquela sociedade conservadora, composta essencialmente por produtores endividados, esperançosos de um dia verem retornar os tempos auspiciosos de outrora, teriam que conviver com um negro pobre, sem berço, sem tradição. Era o fim dos tempos, bradavam as senhoras, rumando para seus chás beneficentes. Para aquela sociedade, tradicional, só “prestava” quem fosse rico de berço. Não lhes interessava que o negro tornara-se um próspero comerciante. O preconceito racial e cultural pesava mais alto.
Pois bem. O novo administrador lutou contra tudo e contra todos. Conseguiu gerar desenvolvimento, emprego, melhorou a renda de boa parte da comunidade. Conseguiu trazer escolas e até faculdades. Pecou pelo excesso. E pela desídia em determinados momentos. Mas obstinado foi até o fim. A sociedade passou a lhe “respeitar”, não obstante jamais ter sido considerado como um dos deles. Torciam, agora calados, pela sua desgraça. Já tinham conseguido tudo e precisavam dele se livrar. Mas isso nunca foi uma tarefa fácil. E novas derrotas viriam. Calvino certa feita disse: “Quando tenho mais idéias do que os outros, dou-lhe essas idéias, se aceitam; e isso é comandar”. Este texto tem a pretensão de ser uma crônica e qualquer semelhança com a realidade é uma mera coincidência. Escrevi e assino embaixo.
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